segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Pela ponta dos dedos é que vamos

No final de jantar, já noite adiantada e bem bebida, achei por acaso um piano encostado ao fundo da sala. Um piano anónimo e discreto, desafinado, disse-me também ele, assim que lhe pousou os dedos. Ele. Ele sentou-se então depois e havia muito burburinho na sala. Ninguém o anunciou. Eu pedi e ele sorriu. Tocou. As vozes foram baixando e os olhares erguendo. Os nossos, alguns que não desconfiavam que a música lhe dá o pão e ele lhe dá a alma em troca, aproximaram-se. O dono do restaurante aproximou-se. Sentamo-nos mudos e imóveis. Aos homens, a alguns, vi o pêlo escuro dos braços levantar-se trémulo como uma seara ao vento. Eu senti água, abruptamente água a inundar-me os olhos. Ele, tocou quatro músicas de enfiada, num restaurante mediocre perdido no meio do nada. Era meia noite e tenho a certeza de que, por alguns momentos, o mundo parou ali mesmo e nós deixamos de saber quem eramos e onde estavamos.

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