Sábado. 21 horas. A chuva a ameaçar. Uma onda de preto e branco. Gente, gente, gente. Gente velha, gente nova, gente de cachecol, gente de bandeiras, gente de pregão na ponta da língua e gente com ar de parva (eu!). Entrar. 21horas e 10 minutos. Bancadas. Pernas estendidas. Passar pelo meio da gente. Gente de pé, gente sentada, gente aos pares, gente de pais e filhos, gente de marido e mulher, gente de amigos. Gente. Nenhuma gente sozinha. Eu, no meio da minha gente daquele sábado cheio de gente. A relva verde lá em baixo. Um tapete. Vontade de estender uma toalha xadrez, deixar os miúdos a correr, beijar com vagar, olhar o céu. Luzes, como se fosse dia, naquele dia em que já há muito era noite. 21 horas e 15 minutos. O tapete a encher-se. Homens pequeninos como meninos aquela distância. Putos de calções, aos 11 de cada vez, uns para cada lado. A gente a explodir de emoção. Eu, no meio da gente. Eu a demorar uns segundos a perceber quem era quem. Quais eram os que a minha gente venerava, para não ser morta ali mesmo, em frente da relva verde. Palmas e mais palmas, a gente a fazer muito barulho “Inde-vos a eles, caralho”. Gente a falar muito alto, palavrões como pregões. Calor, de repente muito calor. No tapete verde, os homens pequeninos a correrem para trás e para a frente. Atrás de mim, 14 anos de gente, não mais. Um verdadeiro fenómeno. Um misto de Gabriel Alves numa voz de Júlia Pinheiro. Uma visão extraordinária. Quem me dera voltar a ter 14 anos só para ter aquela amplitude de visão. 14 anos de gente aos gritos. “Bai Sereno que és lindo!! (versão Júlia Pinheiro)”… “Bai Sereno, pressiona, pressiona, puxa à linha lateral e cruza, cruza Sereno” (versão Gabriel Alves). Eu , confusa,perante um verdadeiro animal mutante… “Oh Sereno, chupamos”… uma hermafrodita da bola. Os homenzinhos corriam no tapete. Havia assobios e aplausos consoante a bola se movia no tapete, louca, num rodopio. E a gente, a gente a levantar-se “Ohhhhhhh”, um bruuuaaa como uma onda. Eu, já de mãos doridas, de gritinhos histéricos, agora que já sabia quem eram os “nossos”. A meio do primeiro tempo a gente levantou-se…devagar, quase a medo e depois numa explosão. Houve novamente palavrões como pregões, risos largos, um barulho ensurdecedor. Depois, foi o intervalo. Depois ainda a segunda parte. Não houve mais explosões. 90 minutos depois saudaram-se, bancada a bancada “fodei-vos, filhos da puta”. Todos em paz. A mim doíam-me as palmas das mãos. Sai a sorrir, no meio da gente que toda ela sorria. A noite estava branda, a gente de coração redondo e verde, o Mundo no pregão certo, a hermafrodita da bola a despedir-se “Foda-se, foi um jogo do caralho!”. Foi sim senhora minha querida!
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2 comentários:
no minimo... o relato mais interesante e comico que alguma vez li sobre futebol... exprementa ir ver um jogo de rugby :)
Afinal há vida para além de nós as 3! Experimentarei para a próxima um jogo de rugby e deixarei feedback (se sobreviver)!
Para já ficam os desejos de um "dia possitivo" para o Ricardo e volte sempre!
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