Estivemos uns com os outros no Domingo. Ontem, portanto. O primeiro sol depois de dias de chuva e frio. O primeiro sol, a seguir outro que já havia vindo, mas que se foi embora. Demorou tanto tempo para que o sol voltasse que me sabe sempre a primeiro, mesmo vindo depois. Como a família que está longe e de quem gostamos, como os amigos que estão longe e que nos fazem falta, como o amor que volta depois do depois. Há sempre qualquer coisa de primeiro, de início em cada instante e uma vontade louca de despertar ternura, de aprumamento. Ontem o sol voltou e eu vesti uns calções. Lancei-me assim para a rua, sem meias, com as pernas ainda demasiado claras, arrepiadas de frio e de vergonha logo que o vento se começou a cruzar comigo. Já não estou habituada a este vento que nos procura os ossos. O Norte é muito mais austero, mais frio, mais íntegro, mais íntimo. Pergunta-me sempre muitas coisas, o Norte, e ás vezes não me apetece responder a nenhuma delas.
Ficamos sentados numa esplanada resguardada. Gente conhecida e gente que não se conhecia. Uma mãe. Ás vezes, quando ouço as mães dos outros, redescubro a sorte que tenho com a minha. Mãe é mãe, mas há umas mães melhores do que outras. O que as torna boas? Talvez o facto de as sentirmos nossas. Não, mas não ,mas não. É uma questão de sorte. Uma boa pessoa que um dia tem a graça de ser mãe. Alguém que nessa sorte tem sorte em nascer e de nascer dentro dela.
Havia um cargueiro ao longe. Falou-se do lá fora que às vezes é longe, às vezes é perto. De Espanha e do Sócrates. Do Papa e da fé. Conversa sem acrescentos, banal como uma tarde de Domingo. Ideias feitas que nos cansam desfazer. Riso ainda assim, que é o que nos salva. Os meus joelhos doidos de frio. O vento a correr e o sol a pôr-se.
Voltamos a casa, chegou um italiano. Fez-se massa para jantar. Bebi demais, custou-me horrores tomar a estrada e não adormecer dentro dela.
O corpo ainda trémulo, cheio de frio.
O sol a acordar comigo hoje e amanha prevê-se também.
Cargueiros ao longe e nós. Nunca sabemos se queremos partir, se havemos de ficar. Sabemos que temos bênções. O sol. Uma mãe, que não é a mãe dos outros. É a nossa e ainda bem. O vinho, tão quente. E os joelhos, que apesar de frios, ainda se insinuam cheios de esperança ao Verão que há-de vir.
segunda-feira, 17 de maio de 2010
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